As palavras de Mayalu

A sessão começou morna - boas vindas, discursos políticos e de políticos. Olhava a minha volta e a gente olhava o celular. Eu mesma levantei duas vezes da cadeira – queria água e banheiro, mas queria principalmente distração. Foi quando Mayalu subiu ao palco. Mulher, indígena, filha das terras do Xingu, chamava a atenção pelos longos cabelos e a pintura tradicional que vestia seu rosto. A voz temblava e a respiração era profunda – é muita emoção para mim estar aqui, explicou. Eu percebia a emoção no tom de voz, mas tinha dificuldades de sentir qualquer coisa parecida – estava desconectada.

Mayalu começou seu discurso com uma canção de guerra do seu povo. Os celulares voltaram para a mesa e os olhares para o palco. Eu, me conectei. Parece que a música em um idioma desconhecido captura a mente e deixa a imaginação refém do significado das palavras.

Depois da canção, Mayalu começou a palestra no formato esperado. Foi longa, mas simples, direta e profundamente verdadeira. Anotei algumas frases, que soltas parecem básicas, mas ditas com a alma, contagiam. Várias delas levaram as pessoas a aplaudir intensamente, como quem transborda envolvimento e agradece a inspiração. Mayalu estava dizendo coisas que fazem todo o sentido, mas que poucas pessoas conseguem comunicar com o poder que ela fazia. Na boca dela, as palavras tinham força porque ela era seu discurso. Mayalu era:

“Nós protegemos as florestas de graça.”
“Não falávamos mudanças climáticas, falávamos destruição do homem, porque sabíamos muito antes do problema.”
“Desenvolvimento é disputa de poder.”
“Precisamos redefinir progresso se quisermos garantir um futuro melhor para nossos filhos.”
“Temos que mostrar para os estudos que somos capazes de enfrentar essa solução juntos.”
“Estou pedindo ajuda para ajudar a manter o modo de vida dos indígenas, para que vocês possam manter o modo de vida de vocês.”


Mayalu é parte da solução do problema que o povo dela não criou. E nós somos parte do problema. Mayalu foi aplaudida de pé. Eu, aplaudi de pé. Quando as palmas cessaram, voltei a sentar, me agarrei ao lápis e escrevi uma nota para mim mesma: como seria minha vida e minha voz se eu fosse parte da solução?

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu acho que vc já é parte da solução quando decide deixar de ser parte do problema...